1.5.07

Livros (Caetano Veloso)

Tropeçavas nos astros desastrada

Quase não tínhamos livros em casa

E a cidade não tinha livraria

Mas os livros que em nossa vida entraram

São como a radiação de um corpo negro

Apontando pra a expansão do Universo

Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso

(E, sem dúvida, sobretudo o verso)

É o que pode lançar mundos no mundo.

Tropeçavas nos astros desastrada

Sem saber que a ventura e a desventura

Dessa estrada que vai do nada ao nada

São livros e o luar contra a cultura.

Os livros são objetos transcendentes

Mas podemos amá-los do amor táctil

Que votamos aos maços de cigarro

Domá-los, cultivá-los em aquários, E

m estantes, gaiolas, em fogueiras

Ou lançá-los pra fora das janelas

(Talvez isso nos livre de lançarmo-nos)

Ou ­ o que é muito pior ­ por odiarmo-los

Podemos simplesmente escrever um:

Encher de vãs palavras muitas páginas

E de mais confusão as prateleiras.

Tropeçavas nos astros desastrada

Mas pra mim foste a estrela entre as estrelas.